Vitorya Paulo/Imprensa FNA
As bicicletas particulares e compartilhadas e os patinetes elétricos estão cada vez mais presentes nas ruas das cidades e transformando a mobilidade urbana. Uma prova dessa mudança é o crescimento de 15,9% de bicicletas apenas no ano passado, segundo dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo). Em 2017, foram 667.363 unidades e, em 2018, a quantidade passou para 773.641. Para 2019, a projeção divulgada pela associação totaliza 857 mil, evolução de 10,8% na produção.
A presença das bikes causa impactos diversos, individuais e coletivos. Pedalar é um exercício físico importante, além de representar a diminuição de poluentes químicos, sonoros e visuais nas cidades. Porém, para inserir os modais de transporte alternativos massivamente nas ruas, é necessário que elas estejam preparadas com políticas públicas. É o que defende o doutor em Urbanismo e pesquisador do Observatório das Cidades, Juciano Rodrigues. Ele pontua três fatores principais para a promoção das bikes: “inserção da bicicleta nas cidades, implantação de infraestrutura adequada e construção de arcabouço institucional”, diz, citando a lei nº 12.587, de 2012, que instituiu as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, sancionada por Dilma Rouseff.
Resultado das políticas públicas voltadas à mobilidade urbana, Rodrigues cita como case de sucesso as bicicletas compartilhadas em Sorocaba, com o sistema IntegraBike, e Fortaleza, com o Bicicleta Integrada. Ambas as iniciativas são geridas pelas prefeituras e conectadas ao sistema de transporte público, ou seja, utilizam o mesmo cartão validador do ônibus e/ou trem. Em Sorocaba, o uso é gratuito por uma hora durante os dias de semana e duas horas nos fins de semana e feriados. Já em Fortaleza, o usuário pode utilizar a bicicleta gratuitamente por 14 horas. Após esse período, deve devolvê-la numa estação compartilhada e aguardar, no mínimo, três horas para efetuar nova viagem.
Para o pesquisador, projetos como esses representam vitória dos investimentos do poder público. “As bicicletas compartilhadas cumprem função utilitária importante, têm controle por parte das prefeituras, que possuem planos de estações e quantidade de bikes”, afirma, citando a construção de ciclovias e ciclofaixas. A intervenção do Estado, portanto, se faz fundamental para que haja regulação e fiscalização desses modais. O que não ocorre, por exemplo, nos sistemas privados de bikes compartilhadas, inseridos por empresas nas cidades e que geram custos para os usuários. “Esses casos nascem do interesse privado, nas suas expectativas de negócios financeiros”, pontua Rodrigues.
Ciclista desde a década de 1980, o presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Cicero Alvarez, conta que, nos últimos anos, nota que há crescimento nas campanhas de conscientização em prol do uso das bicicletas, porém, muitos motoristas ainda não fazem sua parte. “O hábito de olhar o celular ao dirigir tem feito muitas vítimas”, pontua. Alvarez também afirma que os tempos atuais têm mostrado um descaso das pessoas com o outro, um tipo de individualismo que torna ainda mais perigoso pedalar nas cidades.
Nesse sentido, o presidente destaca que os arquitetos e urbanistas têm grande importância para o processo de planejamento das cidades. É trabalho desses profissonais a construção de ciclovias e ciclofaixas, a colocação de paraciclos e bicicletários em lugares seguros e visíveis para dificultar furtos e roubos e o processo de pensar o tempo e custo de deslocamento das pessoas até o local de trabalho. “O planejamento urbano é peça chave. E ele não pode estar atrelado apenas aos interesses do capital e da especulação”, afirma.
Patinetes elétricos: o que está em jogo?
Outro modal que está sendo inserido nas cidades por meio da iniciativa privada são os patinetes elétricos. Os artefatos cresceram exponencialmente nos últimos meses nas grandes metrópoles, como Rio de Janeiro e São Paulo. A última novidade, conforme anunciado pela empresa Grin no dia 15 de fevereiro, é a chegada dos patinetes elétricos na capital gaúcha, Porto Alegre. Em 30 de janeiro, a Grin e a Yellow, em atuação no Brasil, anunciaram fusão das companhias para criar a holding GrowMobility Inc. Somadas, as empresas contam com mais de 135 mil patinetes e bikes em sete países, conforme informado por nota.
Os patinetes elétricos seguem uma lógica de custo parecida com a das bicicletas compartilhadas. O usuário baixa um aplicativo e desbloqueia o uso por ele, pagando uma taxa de R$ 3,00. A cada minuto adicional, é cobrado R$ 0,50. A empresa não disponibiliza capacete de proteção, mas recomenda o uso. Os patinetes devem ser conduzidos em ciclovias ou ciclofaixas na velocidade máxima de 20km/h. Nas calçadas, a velocidade cai para 6km/h.
Rodrigues tem uma visão crítica sobre o equipamento por não ser um meio ativo de locomoção, ou seja, não utiliza a força humana. Além disso, o pesquisador observa que a cobrança por minuto pode levar os usuários a ficarem ansiosos à chegada ao destino, conduzindo os patinetes com imprudência. “Não dá para avaliar, ainda, o impacto [nas cidades] desses dispositivos. É muito incipiente e pontual”, diz. Os patinetes elétricos, por um lado, cumprem a função da não emissão de gases tóxicos no ambiente. Mas, para o especialista, a inserção dos artigos deve ser vista com cuidado. “Estamos queimando etapas”, afirma. Na visão de Alvarez, os patinetes são uma alternativa válida de locomoção. “Todo modal que faz as pessoas se despirem da armadura do automóvel e interagir com a cidade é benéfico para todos”, diz. O presidente afirma que é necessário que a população se enxergue como parte de um mesmo organismo, e não como coisas autônomas que independem do meio. “A cultura de viver em sociedade e interagir com o outro precisa ser resgatada”, conclui.