As transformações pelas quais o modo de produção industrial intensivo vêm passando, desde o século XIX, traz a marca de mulheres que lutaram por direitos e condições dignas de trabalho para todos. Desde as jornadas de luta pela igualdade de gênero, passando pelas reivindicações de direito ao voto ou por melhores condições de trabalho, muita coisa mudou, mas ainda há muito para transformar. As mulheres ainda são alvo de discriminação no mercado de trabalho, com salários mais baixos, assédio, invisibilidade e barreiras para a progressão profissional.
De acordo com a presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Eleonora Mascia, “discutir a presença das mulheres, principalmente em um mercado majoritariamente feminino como a arquitetura, é uma bandeira antiga da FNA e seus sindicatos”. A entidade, que lançou um GT de Equidade e Interseccionalidade neste ano, marca o Dia Internacional da Mulher com destaque para o protagonismo e a atuação feminina das arquitetas e urbanistas dentro do mercado de trabalho por meio da live “8M: A trajetória feminina contra a discriminação de gênero na arquitetura”. O evento acontece na próxima terça-feira (8/3), às 19h30, no canal do YouTube da entidade e conta com a participação de arquitetas e urbanistas representantes dos sindicatos de Santa Catarina, São Paulo, Distrito Federal e Rio de Janeiro.
A coordenadora do GT e Secretária de Comunicação da Federação, Fernanda Lanzarin, explica que a entidade procurou “reunir diferentes perfis de profissionais, atuando em inúmeras frentes, para trazer à pauta o quanto ainda é preciso rediscutir a posição das mulheres, a discriminação de gênero no ambiente trabalhista e a luta de profissionais dentro do movimento sindical”.
Um pouco de história e realidade atual
As lutas pelos direitos trabalhistas, ainda nas últimas décadas do século XIX, passaram a ser bandeiras dos sindicatos, criados ainda na década de 30. A mobilização coletiva levou à instituição da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), aprovada em 1943 pelo presidente Getúlio Vargas. Ao longo do século XX, marcado por transformações na indústria de base e na intensa urbanização brasileira, passam a ser pauta das mobilizações dos trabalhadores temas, como recomposição das perdas salariais, garantias de benefícios sociais e a proteção através da legislação trabalhista. A Constituição Federal de 1988 estabelece o princípio da isonomia, onde todos são iguais perante a lei. Mesmo com avanços na legislação, nos últimos anos, muito se perdeu a partir da precarização das relações de trabalho e da reforma trabalhista de 2017. Hoje o Brasil ocupa o 130º lugar no ranking de igualdade salarial entre homens e mulheres*.
Essa realidade do mercado nacional também se reflete dentro da arquitetura e do urbanismo. De acordo com o 1º Diagnóstico de Gênero na Arquitetura e Urbanismo, realizado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU Brasil) em 2019 e 2020, homens brancos ganham até 52% mais do que mulheres negras. Além da discriminação de gênero, o censo aponta uma maior disparidade quanto se inclui o aspecto racial, também forte componente discriminatório.
Outros dados apontados pela pesquisa, ainda mostram que 44% das profissionais já sofreram discriminação de gênero, 30% assédio moral e 7% assédio sexual. Quando se tratam de mulheres negras, os mesmos números atingem patamares de 59%, 47% e 21%, respectivamente. Fernanda ainda destaca que os números precisam de atenção. “64% do mercado de arquitetura e urbanismo, hoje, é feminino, por isso, a importância de darmos voz às desigualdades e preconceitos vividos pelas arquitetas ao redor do país. A realidade do nosso mercado ainda é muito excludente, tanto pela discriminação de gênero, quanto pela maternidade e outros fatores ligados à vida das mulheres”.
O especial “Arquitetura e Urbanismo por Elas” ainda vai trazer a trajetória de vida e os desafios encontrados durante a formação, a atuação profissional e a luta por direitos. O primeiro perfil, que será divulgado na próxima terça-feira (8/3), apresenta a história da arquiteta e urbanista Karol Almeida, responsável pela Kopa Coletiva, empresa voltada para projetos e reformas dentro da periferia.
*Dados da Global Gender Gap Report 2020.