Istambul não é a capital da Turquia, no entanto detém uma condição singular: tem uma história invejável, mais de 13 milhões de habitantes, umas 2000 mesquitas e um ar de cidade gostosa para se viver. O Bósforo é a alma da cidade. Um canal que interliga o mar Mediterrâneo com o de Mármara e uma vida diária impressionante. Gostei demais da cidade pois ela nos remete o pensamento para uma nova organização urbana das nossas metrópoles brasileiras: um aparente caos no trânsito é resolvido com um tram, um metrô de superfície que anda no meio de ruas estreitas centrais sem nenhum problema; morar em prédios de quatro a seis pavimentos é melhor que morar em casas individuais pois a densidade maior distribui melhor os serviços públicos e por aí vai. O povo de Istambul é algo especial, pessoas alegres, motivadas e muito nacionalistas – em todos os lugares públicos ou privados daquela cidade havia bandeiras da Turquia, aquela vermelha com uma lua e uma estrela. Nosso país é conhecido por lá muito pelos jogadores de futebol, principalmente Alex e Tafarel. Ouvimos falar pouco do samba, mas ouvimos muita bossa nova nos bares e restaurantes. A arquitetura histórica da cidade é muito bonita e muito conservada, como o Palácio Topkapi, a Mesquita Azul, a Santa Sofia e um dos mais belos lugares de visitação pelo inusitado, a Cisterna subterrânea. O turismo é uma das fontes de renda da cidade e com ele o turco ganha, pois sabe receber e vender como ninguém. Por falar em vender e comprar, o Grand Bazaar, que emprestou o nome para o Congresso da UIA, é um espaço impressionante, com umas 3500 lojas numa área central toda coberta de 30 hectares, nada visto no mundo. Chegamos num final de semana e tivemos oportunidade de conhecer um pouco a cidade antes de começar o congresso e essa foi a grande dica. Quando estávamos circulando por alguns belos lugares já sabíamos o que fazer. Para fechar, a comida é ótimo, o clima idem, mas a língua turca é dificílima. Não consegui aprender nenhuma palavra tal a dificuldade. Mas é uma cidade que nenhum arquiteto pode deixar de visitar e conhecer suas belezas urbanísticas e arquitetônicas.

O XXII Congresso da UIA

 

Com o tema CIDADES: O GRANDE BAZAR DAS ARQUITETURAS, o 22 Congresso da UIA foi marcado pela organização e por ausências de convidados famosos. Já na abertura do evento, que ocorreu entre muralhas do século XII, num lugar chamado Seven Towers Fortress e uma imensa fila de ilustres personagens se mostravam nas falas, dentre eles o Primeiro Ministro e o Prefeito de Istambul, um arquiteto de nome KADIR TOPBÁS e claro o presidente brasileiro da UIA Jaime Lerner. Destaques da abertura a apresentação cultural do grupo Yansimalar e a Tefken Philarmonic Orchestra e uma pequena mostra da dança Sufi dos “dervishes”. Mais de 4000 pessoas de acotovelavam no coquetel servido pela organização e, ao pôr-do-sol, muita gente escalou as escadas da muralha e foi ver o cenário do alto. Uma bela abertura de congresso, isso no dia 3 de julho.

No dia 4 de julho a minha maratona começou com Denise Scott Brown, esposa do Robert Venturi, pela manhã; à tarde mais de 2500 pessoas para ver Mario Botta falar de seus mais novos projetos, como a ampliação do Teatro Scalla de Milão; depois um arquiteto de Chicago, Ralph Johnson falando de suas Idéias Urbanas ou como reorganizar os espaços urbanos daquela cidade americana ou ainda o Criticismo na Arquitetura de Joseph Rykwert e para fechar a tarde, Zaha Hadid que abordou seus recentes e mirabolantes trabalhos, com auditório superlotado, seguranças, etc, uma verdadeira show-woman. Algo de novo no primeiro dia de congresso? Apenas a necessidade de compreender os mais famosos arquitetos do mundo dentro de seu campo de trabalho e como eles fazem para resolver os problemas que lhe chegam e que viram as suas obras.

 

Já no dia 5 de julho, começa quente: o sempre polêmico Peter Eisenman aparece vestido com a camisa amarela e vermelha do time Galatassaray de futebol da Turquia que se sagrou campeão da Europa (em 1996 em Barcelona, Eisenman também apareceu para falar com a camiseta oficial do time de futebol do Barcelona) e falou os diabos da arquitetura de Zaha Hadid e de Frank Guerry, denominando-as de “excessivamente computadorizada” para falar palavras mais simples. De fato Eisenman aborda a produção dos outros e não a sua, mas converge pela discussão da arquitetura de qualidade produzida no mundo, sem deixar de comentar projetos de grande impacto como o do Norman Foster em Londres, mais recente, o ovo britânico. A grande ausência desse dia foi Dominique Perrault que iria falar de suas obras em andamento.

 

No dia 6 de julho, logo cedo pela manhã, outra ausência: Massimiliano Fuksas, que também iria comentar seus recentes projetos e no final da tarde outra ausência, desta vez do italiano Paolo Portoghesi que abordaria projetos do pós-modernismo. Entre uma ausência de palestrante e outra, pudemos apreciar o conjunto do espaço destinado ao congresso, no caso uma imensa área formada pelo Centro de Convenções de Istambul cercado de outros prédios, inclusive o Museu Militar da Turquia, que cedeu espaço para o evento ou ainda a Escola Politécnica que funcionou como a sede administrativa do Congresso.

 

Entre painéis e trabalhos de todo o mundo – sejam dos países mais desconhecidos ou dos mais importantes-senti uma enorme ausência do Brasil. Sem nenhum stand formal dentro do Congresso, nossa arquitetura não foi vista pelos 6.500 participantes, segundo o Presidente do Congresso o arquiteto Suha Oskan. Apenas trabalhos de colegas em painéis ou em apresentações temáticas distribuídas nas salas do evento.

 

Não pude assistir Douglas Aguiar da UFRGS, das vilas populares de Porto Alegre; Aline Sampaio Guimarães, de Recife, falando dos espaços públicos; Leonardo Oba de Curitiba ou Joaquim Guedes e equipe de São Paulo, apenas para falar dos brasileiros presentes.

 

O dia 6 de julho se encerra com a mais procurada conferência: Tadao Ando, com seu amigo que fala inglês, apresenta sua visão de arquitetura, voltada para o novo mundo das relações internacionais e condiciona seu trabalho a algo mais duradouro que o fazer arquitetônico.

 

No dia 7 de julho, no alto de seus mais de 70 anos, Robert Venturi acompanhado de sua esposa, profere uma brilhante palestra e nos mostra porque seus livros foram tão importantes para a discussão crítica da arquitetura mundial. Claro que nos anos 2005 falar de Universalidade e do Multiculturalismo é um prato cheio, diante das aberrações cometidas no mundo e é claro que devemos continuar tendo pessoas do quilate de Venturi para abrir os olhos quando necessário. Assim caminha a arquitetura contemporânea: multicultural e exagerada.

 

 

Corri para outro lugar após a palestra do Venturi e fui assistir, como Presidente da FNA, uma pouco concorrida mesa, dessa vez burocrática, pela UIA e sua direção onde o futuro Secretário Geral da UIA, o catalão Jordi Farrando que apresentou uns dados estatísticos mundiais sobre arquitetura muito legais.

 

Segundo Jordi, o mundo possui hoje algo em torno de 1.230.000 arquitetos dos quais 307 mil no Japão, 151 mil na Itália, 102 mil na USA e uns 80 mil no Brasil. Depois vem a Alemanha com uns 50 mil, China com 36 mil, Inglaterra com 31 mil e França com 26 mil arquitetos, ou seja, somos a QUARTA comunidade internacional de arquitetos no Planeta.

 

Entretanto, no campo da futura formação profissional uns 390 mil entram no mercado nos próximos anos enquanto no Brasil uns 8,5 mil ao ano.

Esses dados são de 91% dos países do mundo.

 

Outros dados legais dizem que a formação média mundial é de cinco anos e que em 82% dos países a profissão é regulamentada por lei e proteção ao exercício profissional e que em 90% há um código de ética profissional.

 

Esse material é de suma importância para nossas discussões internacionais e nacionais sobre nossas práticas.

 

Outra apresentação dessa mesa da UIA foi a do Michael Peck (Austrália) e James Scheleer (USA) acerca dos parâmetros do livre exercício profissional e encerrou com uma apresentação do malasiano Esa Mohammed acerca da utilização do Acordo da UIA e das recomendações a pratica profissional que foi usada na Malásia para incorporar a legalização do exercício do arquiteto naquele país.

 

No dia 7, outra ausência muito sentida foi a de Rem Koolhas que foi coberta pela apresentação do indiano Charles Correa e seus projetos habitacionais. Para fechar o dia, Ken Yeang, falando do Green Design, ou seja, as propostas para uma arquitetura sustentável, encheu de gente a sala e por essa ele não esperava.

Do lado de fora dos grandes auditórios do Centro de Convenções, estavam armados os stands de Turim, cidade italiana escolhida para sediar o XXIII Congresso em 2008 e uma pequena disputa entre o Tóquio e Duban, cidade sul-africana, para sediar o XXIV Congresso em 2011.

 

Falando em 2011, o Brasil estava na lista para disputar, mas com os altos preços e custos estabelecidos pela UIA, o pessoal do IAB já sabia que não teria chance nenhuma, principalmente contra o Japão que nunca sediou um Congresso e que possui a maior comunidade de arquitetos do mundo.

 

O Congresso se encerrou com um dia de festas culturais no Istambul Modern Museum, um desses barracos de cais do porto, restaurados e cheios de obras de artes plásticas do pessoal da Turquia e um belo show patrocinado por uma das empresas nacionais do evento.

 

Lições tiradas de um Congresso do porte de um desses mundiais: deixe seu cartão na mão para trocar com as pessoas e aprenda um pouco mais sobre a arquitetura produzida no mundo. É isso.

 

Nos dias 8, 9 e 10 de julho, aconteceu a Assembléia da UIA, dessa vez uma reunião onde somente participam os delegados de cada país e o Brasil esteve lá representado pelos colegas do IAB, comandados pelo Presidente Demetre Anastassakis e que tivemos a honra de fazer parte da delegação brasileira como convidado suplente.

 

Naquela oportunidade da Assembléia da UIA, um caderno com as teses foi distribuído e dele se tiram inúmeras lições e conclusões: precisamos participar mais e mais de eventos mundiais para garantir nossa inserção.

 

Por fim, temos uma nova diretoria eleita para a UIA 2005/2008, presidida por Gaetan Siew, um membro da Direção da UIA que deixa com o Lerner presidente, um arquiteto das Ilhas Maurício.