“Não podemos falar em Desenvolvimento sustentável, sem falar da preservação do bem maior de todos os direitos: a vida”, defendeu o presidente da FNA, Jeferson Salazar, que mediou a mesa Desenvolvimento Sustentável no 2o Encontro CAU com a Sociedade, nesta última semana. O evento também contou com a participação do secretário Estadual de Ambiente, Carlos Minc, e do professor da FAU/UFRJ, Roberto Anderson. Confira abaixo a íntegra do discurso.

 

 

Desenvolvimento Sustentável – Eixos Ambiental, Social e Econômico

 

   

Este debate nos traz à lembrança a Carta Brasileira da Paisagem, desafio colocado pela Federação Internacional de Arquitetos Paisagistas – IFLA, através da sua entidade filiada no Brasil, a Associação Brasileira dos Arquitetos Paisagistas – ABAP. A Carta Brasileira da Paisagem apresenta doze princípios basilares que foram apresentados em evento na Cúpula dos Povos, durante a realização da Rio+20, com o apoio das entidades nacionais de arquitetos e urbanistas, em especial da FNA, fazendo uma reflexão sobre os avanços conquistados pela sociedade contemporânea de forma a contribuir para a consagração de dois projetos ainda mais ambiciosos: A Carta Latino Americana da Paisagem e A Convenção Global da Paisagem. Podemos afirmar que há uma campanha vitoriosa em construção, com a Carta da Paisagem Mediterrânica (1993), a Convenção Europeia da Paisagem (2000) – que atualmente conta com a adesão de 38 países e a o estabelecimento do debate nos países da África e América Latina. Na América do Sul o Parque Nacional Iguazú (Argentina-1934) e o Parque Nacional do Iguaçu (Brasil-1939) são exemplos de que é possível preservar um patrimônio natural comum sem abdicar da soberania das fronteiras nacionais.

 

Entretanto, o objetivo da Carta da Paisagem vai muito além de definir regras de preservação da paisagem para simples contemplação. Em seu princípio fundamental observa o ser humano como agente protagonista do processo de transformação da paisagem (natural, rural ou urbana), buscando harmonizar as necessidades humanas com a perspectiva de desenvolvimento sustentável, calcado em uma nova cultura de organização da sociedade e romper com os paradigmas estabelecidos de financeirização e monetarização dos bens comuns da humanidade.

 

Para tanto, direitos fundamentais devem ser consagrados tanto no campo quanto na cidade, sendo necessário dar qualidade à premissa básica da função social da propriedade, estabelecida na constituição brasileira e que é o elemento chave para avanços sociais mais significativos de combate à concentração de patrimônio e renda, à fome e à pobreza. Se no campo o agronegócio controlado exclusivamente pelo grande capital, o latifúndio improdutivo e a exploração insana das riquezas naturais, que dilapidam florestas e áreas de preservação em benefício de poucos e em detrimento dos interesses maiores da nação, se aliam e impedem a realização da reforma agrária, na cidade a falta de vontade política aliada à especulação financeira e à especulação imobiliária impedem a implementação dos instrumentos do Estatuto da Cidade e, consequentemente, da reforma urbana.

 

 

 

E é neste cenário que muitas indústrias ainda têm pouca ou nenhuma preocupação com os efeitos da sua produção sobre populações inteiras; a copa do mundo e as olimpíadas têm sido mote para a prática da segregação social, com remoções forçadas para áreas periféricas das cidades; o Programa Minha Casa Minha Vida está desvinculado de uma política nacional de desenvolvimento urbano; e há uma absoluta precariedade de políticas públicas integradas voltadas para solucionar os graves problemas urbanos atuais, afetando negativamente a vida de parcela significativa da população brasileira, principalmente daquela de menor faixa de renda.

 

 

Não podemos falar em Desenvolvimento sustentável, sem falar da preservação do bem maior de todos os direitos: a vida. E se este conceito não for apenas retórica e a vida realmente for considerada o maior de todos os direitos do ser humano, para exercer este direito com dignidade devemos entender que o direito à terra e à moradia, ao saneamento e à saúde, à educação e à cultura, ao trabalho e ao lazer, à mobilidade e à acessibilidade são direitos fundamentais da condição humana. São, portanto direitos coletivos essenciais, inalienáveis e absolutos e, necessariamente, devem estar acima dos direitos individuais e econômicos.

 

É com estas premissas que esperamos que o tema Desenvolvimento Sustentável – Eixos Ambiental, Social e Econômico, venha a ter a capilaridade necessária para a construção de propostas que reflitam os reais interesses coletivos da sociedade. E da sociedade, como protagonista da sua própria história, esperamos que faça valer os seus direitos coletivos essenciais: inalienáveis e absolutos.

 

 

Jeferson Roselo Mota Salazar

Presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas