O recente desabamento da ciclovia Tim Maia, no Rio de Janeiro, expõe um problema recorrente na administração pública brasileira: a falta de controle sobre a execução de obras públicas. Geralmente contratadas por meio de licitação, as benfeitorias são delegadas a empreiteiras e seguem com a anuência do poder público sem nenhuma espécie de supervisão interna. Muitas são, inclusive, entregues à comunidade sem nenhum tipo de laudo técnico que ateste a sua segurança. O fato recente leva a Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA) a alertar a sociedade para a falta de arquitetos e urbanistas no quadro efetivo das prefeituras brasileiras e para uma avalanche de obras sem controle.

 

Infelizmente, o caso da ciclovia carioca não é isolado. Basta recordar episódio similar ocorrido em Belo Horizonte em 2014, quando do desabamento do viaduto dos Guararapes, na véspera das semifinais da Copa do Mundo. A obra sequer havia sido concluída. São tragédias emblemáticas e, ao mesmo tempo, anunciadas. Ocorrências que retratam uma realidade distante da que se espera para o desenvolvimento das cidades brasileiras.

 

A situação agravou-se com adoção do chamado Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) e da Contratação Integrada. Criado para obras da Copa, o método permite a “contratação integrada”, onde a administração pública licita uma obra com base apenas em estudo preliminar, transferindo às empreiteiras a responsabilidade pelos projetos. “É uma contratação de serviço que não garante a qualidade necessária da obra do ponto de vista técnico. Nossas cidades precisam de arquitetos e urbanistas dignamente remunerados que zelem pelo bem estar do coletivo”, salientou o arquiteto e urbanista Jeferson Salazar, presidente da FNA.

 

Sem corpo técnico suficiente para fiscalizar os processos, centenas de obras são realizadas todos os anos sem o acompanhamento devido. Quando existem, as equipes padecem com a carência de profissionais em seus quadros e/ou com salários abaixo do valor mínimo fixados pelo regramento da profissão. “É inaceitável que projetos em andamento ou recém concluídos e que demandaram vultosas somas de recursos públicos venham abaixo. Diante de episódios com este, as instituições públicas precisam ter consciência da importância do projeto como elemento preventivo e que profissionais especializados ligados diretamente à administração pública são imprescindíveis no acompanhamento de todos os processos”, ressalta Salazar. Segundo o dirigente, o descaso pode custar caro à sociedade. “São pequenos detalhes técnicos que fazem a diferença. É preciso pensar no bem das cidades e de seus moradores”, completou.

 

Evidentemente lamentamos as vidas perdidas. Mas além disso, nos cabe exigir a investigação das causas da ruína da ciclovia, desde a decisão de se realizar a obra beirando a encosta; possíveis erros de projeto; provável falta de estudos prévios sobre o ciclo das ondas na região da ciclovia; possíveis erros de execução; possibilidade de leniência da fiscalização; além de não descartar outras possibilidades e até a sinergia entre diversos fatores. Há uma cadeia de responsabilidades e, neste momento, não podemos fazer coro às especulações sobre o caso, nem julgamentos prévios que possam condenar inocentes antes de comprovada a culpa. Até o presente momento só temos duas certezas: a ciclovia foi arrastada pelas ondas e vidas foram perdidas. Entretanto, apuradas e comprovadas as responsabilidades, que sejam aplicadas as devidas punições a quem couber. Esperamos que exemplos como este não prosperem e mais vidas sejam desperdiçadas.