A relação entre a arquitetura e o processo político de 193 estados membros das Nações Unidas foi analisada por dois arquitetos que viajaram o mundo estudando parlamentos. David Mulder van der Vegt e Max Cohen de Lara analisaram não apenas a composição dos parlamentos, mas principalmente o design das estruturas que abrigam os políticos e instigaram a reflexão sobre o tema da arquitetura e urbanismo como instrumento ideológico. O resultado do trabalho foi reunido no livro “Parliament”.

Para apresentação na obra, os arquitetos dividiram os designs de parlamentos em cinco categorias: semicírculo, ferradura, bancos opostos, círculo e sala de aula. Segundo eles, cada uma dessas composições define a forma como os debates são conduzidos no interior de cada órgão político. “O parlamento é o espaço onde a política toma forma. Aqui, decisões coletivas são feitas num cenário específico, onde as relações entre os atores políticos são organizadas pela arquitetura. A arquitetura dos espaços políticos não é apenas uma expressão da cultura política, mas é também responsável por moldar essa cultura”, escreveram os arquitetos na introdução do livro.

O parlamento britânico, por exemplo, foi levado para o debate. O atual design da Casa dos Comuns, localizada no Palácio de Westminster, em Londres, foi desenhado no pós-Guerra em sistema de bancos opostos pelos arquitetos Charles Barry, Augustus Pugin e Giles Gilbert Scott, à pedido de Winston Churchill. Assim, os dois principais partidos políticos se encaram face a face. “A tipologia permite delinear claramente entre o partido governista e a oposição”, escrevem os autores.

O número de parlamentares aumentou, porém, as proporções do cômodo foram mantidas. “É muito pequeno, nem todo mundo tem um assento, então automaticamente você tem um debate mais intenso. Ao mesmo tempo, pelos assentos opostos, você imediatamente percebe a posição de alguém no debate”, disse David Mulder van der Vegt à revista “Wired”.

Já o parlamento alemão, desenhado pelo britânico Norman Foster em 1999 como parte das renovações do clássico Palácio do Reichstag, em Berlim, segue o esquema de semicírculo – mais popular nos governos europeus. O layout, que lembra o de uma plateia, tem de fato origens clássicas, tendo sido utilizado inicialmente em teatros gregos e romanos, para favorecer a visibilidade e acústica do palco. Como no formato britânico, os políticos são postos no mesmo nível do chão, eliminando sinais de hierarquia. No entanto, diferentemente do anterior, governistas e opositores misturam-se na sala.

O formato sala de aula, por sua vez, em que parlamentares são posicionados em fila voltados a um orador, é encontrado na Rússia, entre outros países. De acordo com os autores, é uma disposição popular em países não-democráticos. “É obviamente uma forma bem prática se você quer focar toda a atenção em um ponto”, ressaltou Van der Vegt.

O Congresso brasileiro apresenta uma das disposições mais peculiares, analisam os arquitetos. Próximo ao design usado pelos russos, chineses e norte-coreanos, a Câmara dos Deputados desenhada pelo modernista Oscar Niemeyer é disfarçada pelo formato oblongo do cômodo e pelas fileiras de cadeiras delgadas, mas ainda sim segue o modelo sala de aula.

Após conhecerem e analisarem tantos congressos, Van der Vegt e Cohen de Lara chegaram à conclusão de que é necessário uma renovação na arquitetura dos parlamentos do mundo. Segundo eles, as tipologias no geral estão presas aos estilos e governos do Século 19. “Governos operam de forma diferente hoje do que há cem anos e as assembleias falharam em acompanhar as mudanças. Novos designs poderiam incluir, por exemplo, assentos flexíveis que podem mudar de acordo com a dinâmica política”, escreveu a “Wired” sobre o tema.

O resultado do trabalho dos arquitetos, assim como imagens feitas em 360º dos congressos visitados, estão disponíveis no link: http://www.parliamentbook.com/spaces