O incêndio e o desabamento de um edifício da União localizado no centro de São Paulo, ocupado por famílias de baixa renda, revela problemas que os arquitetos e urbanistas e movimentos de moradia denunciam há décadas: a falta de assistência técnica pública e de orientação correta para a destinação dos imóveis da União.
O edifício foi tombado em 1992 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo e era administrado pela SPU (Secretaria do Patrimônio da União). Segundo a Portaria Nº 45 da Secretaria, de 06 de abril de 2015, o mesmo deveria ter prioridade de destinação para a provisão de habitação de interesse social. Em desacordo à Portaria, a SPU tentou leiloá-lo nesses últimos anos por duas vezes, sem sucesso.
O seu abandono dentro de um cenário de escassas políticas públicas habitacionais o levou a ser ocupado e mantido como abrigo provisório para aproximadamente 160 famílias, por mais de seis anos. A causa do incêndio que antecedeu o desabamento foi acidental – e não criminosa ou por falta de manutenção. Ainda que com parcos recursos e pouca orientação técnica, as famílias ocupantes puderam zelar pelo imóvel que moravam. Sua degradação, portanto, antecede a ocupação e ocorreu única e exclusivamente devido ao descaso do poder público.
O Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo (SASP) acompanha de perto situações como essa desde 2014 e verifica que a dificuldade de em solucionar o problema da habitação se dá por sucessivos erros de orientação política e ideológica de grande parte dos governantes.
Os quadros de carreira da SPU se dedicam a cuidar do patrimônio público, porém têm dificuldades em realizar encaminhamentos mais ágeis por falta de recursos humanos, técnicos e financeiros. Estes não possuem, em sua estrutura de trabalho, assistência técnica para apoiar a viabilização das destinações desses edifícios e, dificilmente, encontram esse serviço nas prefeituras e entidades que poderiam receber os imóveis da União. Deparam-se, ainda, com uma estrutura que se limita ao nível do cartório e sem abertura para concursos públicos, inviabilizando novos quadros de carreira. Com um Estado estruturado e presente, ocupações precárias – como esta – seriam desnecessárias.
A contratação de arquitetos e urbanistas, engenheiros, topógrafos, advogados e assistentes sociais, dentre outros profissionais, que possam encaminhar adequadamente a destinação dos imóveis da União é urgente, tanto para serviços permanentes como temporários. Ao invés disso, Temer anuncia um novo leilão de imóveis com o discurso de usar esses recursos para sanar as contas do Governo Federal. Muito longe de resolver um problema sistêmico da economia brasileira, o leilão de terras públicas cai novamente na mesma lógica privatista e de diminuição do papel e das condições do Estado em atender suas demandas sociais, como a de moradia.Temer tentou visitar os escombros do acidente na manhã de hoje, porém teve que sair escoltado e sob ameaças da população revoltada. Não à toa que a revolta veio à tona: após anos sem nenhuma atenção ou atitude que pudesse solucionar este problema, se aproveitar das dores dos trabalhadores para ganhar popularidade não é mais uma prática aceita no Brasil.
O SASP se solidariza com as famílias e com os movimentos sociais que vêm demonstrando, em parceria com as assessorias técnicas, que há, sim,solução para a moradia de interesse social nos imóveis abandonados dos centros urbanos, lembrando, como exemplos, os casos do Ed. Dandara (Av. Ipiranga, 1225) e Conjunto Habitacional Conselheiro Crispiniano/Iracema Eusébio (Rua Conselheiro Crispiniano, 125).Nenhuma vida vale menos que qualquer imóvel. Não nos esqueceremos desse 1º de maio de dor e de luta para os brasileiros, reforçando aqui nosso compromisso com a valorização da arquitetura e urbanismo social.
Maurilio Chiaretti,
presidente do SASP