Uma conquista histórica. Esta foi a expressão do presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/BR), Jeferson Salazar, para definir a grandiosidade da publicação do Projeto de Lei 642-A /2017 no Diário Oficial do Estado. De autoria da ex-vereadora Marielle Franco, a matéria institui a assistência técnica pública e gratuita para projeto e construção de habitação de interesse social às famílias com renda mensal de até três salários mínimos na cidade do Rio de Janeiro.

A sanção do projeto pelo prefeito Marcelo Crivella no último dia 12 de junho, e publicada dia 13 (sexta-feira), foi amplamente comemorada por arquitetos e urbanistas, principalmente pelos que lutam por condições de moradia e cidade igualitária a todos. “Essa publicação foi uma vitória, especialmente pelo projeto ser de autoria de Marielle e ter sido objeto de sua luta antes de ser brutalmente executada”, comemorou Salazar. Contudo, apesar do avanço, ele afirma que foi apenas o primeiro passo de uma longa jornada. “Precisamos fazer com que esta lei saia do papel e passe a existir no cotidiano das pessoas. E o momento é propício para que o poder público da cidade escolhida como a Capital Mundial da Arquitetura mostre a viabilidade das soluções para habitação de interesse social”, desafia.

A vice-presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Eleonora Mascia, ressalta a importância de haver uma lei municipal com base na Lei 11.888, que desde 2008, prevê a mobilização de recursos públicos federais para garantir o direito à moradia e à cidade. “Deve-se destacar, também, que o Projeto de Lei foi elaborado pela vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada em 14 de março de 2018, em circunstâncias até hoje não esclarecidas. Para a FNA, é importante mantermos viva a luta por uma cidade para todos com direito à moradia, ao trabalho e à qualidade de vida, buscando diminuir as desigualdades econômicas e sociais”, salienta.

De acordo com a nova legislação, além de ter renda mensal de até três salários mínimos, as famílias beneficiadas devem possuir um único imóvel e residir na cidade há, pelo menos, três anos. A assistência técnica gratuita será prestada para elaboração de projeto, construção, reforma, ampliação e regularização fundiária de habitação de interesse social. A lei ainda prevê otimizar e qualificar o uso e o aproveitamento racional do espaço edificado e seu entorno, além de evitar a ocupação de áreas de risco e de interesse ambiental. Para implementação da lei, a prefeitura poderá contar com recursos da União, na formada Lei Federal n° 11.888/2008, por aportes do Estado do Rio de Janeiro, por dotações orçamentárias próprias ou ainda por meio de outras fontes de financiamento que vierem a ser viabilizadas.

Rodrigo Bertamé, presidente do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Rio de Janeiro (SARJ), alerta que a publicação abre um importante espaço democrático para a categoria. “Cabe, agora, às nossas entidades articular os profissionais e a sociedade civil para garantir arquitetura e urbanismo dignos e socialmente referenciados a todo cidadão do município, tendo a lei como instrumento para garantir a viabilidade técnica e econômica para uma população que, até então, não se via assistida por políticas de inclusão social e pelo direito à cidade”, argumenta.

O peso político da criação da nova lei também foi ressaltado pela arquiteta e urbanista Karla Moroso, uma das autoras da Cartilha “ATHIS-Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social”, produzida pelo CAU/SC com a Ah! Arquitetura Humana. “Essa lei é um grande marco da assistência técnica no Rio de Janeiro, pois insere o município no sentido normativo. Além disso, é consequência da luta de Marielle Franco dentro da Câmara Legislativa do Rio, o que lhe confere uma importância política muito grande”., pontua. A cartilha foi vencedora da categoria Setor Público do 13º Prêmio Arquiteto e Urbanista do Ano da FNA 2018, e também contou com a produção dos arquitetos e urbanistas Taiane Beduschi, Paola Maia Fagundes e Franthesco Spautz.

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