O Senado federal sepultou nesta semana a possibilidade de que a maioria dos trabalhadores tenha acesso à proteção social após anos de trabalho e contribuição ao governo. A Reforma da Previdência (PEC 06/19) aprovada no segundo turno no Senado, por 60 votos favoráveis e apenas 19 contrários, traz consigo regras que reduzem os valores dos benefícios de aposentadoria de trabalhadores com renda baixa, que são os que mais enfrentam a rotatividade, a precariedade e longos períodos de desemprego.
A criação de uma idade mínima para a aposentadoria é a principal mudança, que foi aprovada pelo Senado sem alterações em relação ao texto aprovado na Câmara, em agosto. Agora, os novos trabalhadores só poderão se aposentar com idades de 62 anos (mulheres) e 65 anos (homens), tanto na iniciativa privada quanto no setor público federal, com tempo mínimo de contribuição de 15 anos (mulheres), 20 anos (homens) e 25 anos para servidores de ambos os sexos.
Ana Georgina Dias, supervisora técnica do Escritório Regional do Dieese na Bahia, ressalta que a PEC vai atingir a vida dos trabalhadores de forma bastante dura. Mas destaca que entre os setores da população mais penalizados estão as mulheres, que passam a ter a exigência de um tempo maior de contribuição. “Ampliar em 24 meses o tempo tende a retirar ainda mais mulheres da proteção da previdência”, afirma, lembrando que idade mínima inferior para mulheres não é privilégio dentro de uma realidade onde cada vez mais elas são as únicas responsáveis pelo comando do lar, têm dupla jornada não remunerada e uma maior dificuldade de ingressar no mercado de trabalho.
No país onde o mercado de trabalho vem apresentando leve melhora por conta da ocupação na informalidade, Ana chama a atenção para o fato de que a renda média entre os 50% ocupados na informalidade – segundo dados da última amostra da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE), é de apenas R$ 418,00. “São justamente essas pessoas com baixa renda que serão as mais prejudicadas pelas regras aprovadas”, afirma. Além disso, a especialista do Dieese sustenta que a dificuldade de acesso à previdência vai impactar também sobre os pequenos municípios que não possuem econômica local forte e têm a Previdência como principal fonte de recursos além de outras políticas de transferência de renda. “Quando se dificulta o acesso à previdência se está também retirando renda e subsistência desses municípios”, afirma. Outro ponto destacado por Ana que se mostra bastante contraditório são as reais consequências da Reforma Trabalhista (aprovada em novembro de 2017), que precarizou as relações de trabalho ao permitir jornadas intermitentes e terceirizações, por exemplo – permissões que reduzem drasticamente a possibilidade de contribuição previdenciária regular por parte dos trabalhadores. “Enquanto isso, a Reforma da Previdência passa a exigir maior tempo de contribuição desses mesmos trabalhadores”, elucida.
O texto principal da PEC 06/2019 restringe o benefício à média de todos os salários do trabalhador, impõe uma idade mínima para a aposentadoria, amplia o tempo de contribuição para requerer o benefício, aumenta percentuais de contribuição ao INSS e define regras de transição para quem atua hoje no mercado como assalariado. “Com o pretexto de reduzir o déficit previdenciário, o governo acaba penalizando ainda mais o cidadão brasileiro, pois esse terá que trabalhar por muito mais tempo para conquistar um direito previsto na Constituição”, afirma Cicero Alvarez, presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA). Cicero reforça ainda que após o período de transição, os brasileiros só poderão se aposentar com o benefício integral após atingirem a idade mínima exigida – 65 anos para homens e 62 para mulheres – e o tempo de contribuição de 35 anos para homens e 30 para mulheres. “Muitos não conseguirão, uma vez que a expectativa de vida se diferencia nas regiões do país e até mesmo dentro de uma mesma cidade e bairro”, pontua.
Foto: Ana Georgina Dias / Divulgação