No período de 2012 a 2018, uma plataforma que concentra os registros de acidentes de trabalho no Brasil apurou apenas cinco notificações relacionadas a profissionais da arquitetura e urbanismo e 11 a arquitetos de edificações. Os números constam no SmartLab, Observatório da Diversidade e da Igualdade de Oportunidades no Trabalho criado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Os dados, segundo a assistente social e professora da USP, Ariana Celis, se mostram preocupantes e revelam uma clara subnotificação de casos decorrentes de acidentes de trabalho no âmbito da categoria.

Ariana apresentou os números durante a live FNA#11, que na noite desta quarta-feira (30/09) abordou o tema Assédio moral nas relações de trabalho: questões de saúde e jurídicas. Para a especialista da USP, no relatório constavam em sua ampla maioria casos como fraturas e lesões por múltiplos fatores. “Além do baixíssimo nível de registros da categoria, nenhum deles estava relacionado a questões de saúde mental”, destacou. E como efeito comparativo, Ariana citou o caso dos profissionais que atuam no atendimento à saúde, cujos registram somam 378 mil no mesmo período analisado.

“Do que adoecem os arquitetos”? foi o questionamento da assistente perante a ausência de dados no SmartLab, intrigada com o baixo índice de comunicação e nenhuma correlação com casos de saúde mental – muitos deles motivados por assédio no ambiente de trabalho. “Hoje, crises de saúde mental são o terceiro fator que mais gera afastamentos pelo INSS e somente com as notificações é possível trabalhar na prevenção e promoção da saúde do trabalho em parceria com as superintendências regionais do trabalho, sindicatos e até universidades”, pontuou. De acordo com Ariana, é fundamental que casos de assédio em todos os níveis sejam comunicados ao RH das empresas, aos sindicatos, médico do trabalho ou profissional de saúde.

A presidente da FNA, Eleonora Mascia, corroborou com a fala de Ariana, ao levar para o debate alguns trechos extraídos do 1º Diagnóstico de “Gênero na Arquitetura e Urbanismo”, da Comissão Temporária de Equidade de Gênero do CAU/BR. Realizado online, de julho de 2019 a fevereiro de 2020, o levantamento foi respondido por 987 profissionais, sendo 767 mulheres e 208 homens. No tópico sobre assédio (moral e sexual) com recorte racial, o resultado preocupa: 59% das mulheres negras entrevistadas declararam sofrer discriminação de gênero, contra 8% dos homens brancos; 47% delas foram assediadas moralmente e 21% enfrentaram o assédio sexual. Eleonora reproduziu relatos que constam no diagnóstico que evidenciam a rotina de arquitetas e urbanistas mulheres no ambiente profissional. “São situações desgastantes que põem em prova a capacidade física e intelectual das arquitetas e urbanistas”, disse a presidente da FNA. Eleonora destacou ainda que a reforma trabalhista, ao promover a precarização das relações de trabalho, estimular a pejotização, acabou por fragilizar ainda mais os trabalhadores de uma forma geral, e contribuindo para que casos de assédio não chegam às instâncias superiores.

Já o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sergio Takemoto, levou para o debate números extraídos de pesquisa realizada pela própria federação em 2018/2019 com 2 mil servidores da Caixa. “33% disseram ter apresentado algum problema de saúde no ambiente de trabalho nos últimos 12 meses, sendo que, desses, 10% se referem à depressão e 60% dos casos de doenças psicológicas são decorrentes do stress. Além disso, 20% relataram transtornos de depressão por ansiedade e 51% dos pesquisados confirmaram conhecer casos de colegas em sofrimento”, relatou Sérgio. A partir dos dados da pesquisa, a Fenae lançou a campanha #NãoSofraSozinho, visando a proteção, apoio e acolhimento dos trabalhadores da Caixa em situação de vulnerabilidade dentro do ambiente profissional.

De acordo com Takemoto, a pandemia escancarou ainda mais essa realidade, uma vez que com a maioria dos servidores em home office (60%), restou aos funcionários que permaneceram nas agências dar conta de toda a rotina normal de trabalho acrescida com a demanda do auxílio emergencial, que até hoje lota as agências. “Além de tudo isso, os funcionários continuaram a ser cobrados por metas”, disse. Embora a categoria bancária seja uma das mais organizadas, ainda há muito a ser feito no sentido de estimular os servidores a denunciar situações de assédio e episódios de constrangimento nas agências. “Precisamos fortalecer sindicatos, associações e organizações para sempre responder a isso”, destacou o dirigente.