“Mais de 85% dos brasileiros constroem e reformam sem orientação de arquitetos e urbanistas ou engenheiros.” O número levantado a partir da pesquisa realizada pelo CAU/BR e pelo Instituto Data Folha, em 2015, expõe uma realidade preocupante da habitação brasileira e indica a necessidade de mudanças. Apesar do momento difícil para as políticas públicas voltadas à moradia social, iniciativas que têm berço na universidade pública ganham reconhecimento.

Um case vencedor vem da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (FAUfba), que recentemente recebeu a certificação do Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social pelo projeto Residência em Arquitetura, Urbanismo e Engenharia – Especialização em Assistência Técnica, Habitação e Direito à Cidade. A premiação realizada a cada dois anos desde 2001 identifica, certifica e difunde tecnologias sociais já aplicadas, implementadas em âmbito local, regional ou nacional. Para isso, precisam ser efetivas na solução de questões relativas a habitação, alimentação, educação, energia, meio ambiente, recursos hídricos, renda e saúde.

O viés social do projeto da FAUfba no âmbito da ensino-pesquisa-extensão foi destacado também pelo seu ineditismo. A experiência pioneira viabiliza assistência técnica pública e gratuita com o desenvolvimento de projetos de moradia digna e melhorias ambientais para comunidades vulneráveis, fortalecendo a inserção social da universidade pública em atividades extensionistas. A iniciativa vem desde 2013 e já permitiu a diplomação de 73 profissionais que passaram pelas turmas formadas em 2013/2014, 2015/2016 e 2017/2018, envolveu 53 docentes e, indiretamente, alcançou mais de 1000 pessoas, se incluídos os públicos participantes das oficinas obrigatórias que formam a grade do projeto.

Embora políticas habitacionais tenham sido implantadas nas últimas décadas no Brasil, com recursos públicos expressivos, seus resultados não atenderam à ampla demanda social de habitação para famílias de baixa renda, nem a melhoria das ocupações periféricas. Os déficits habitacionais persistem e as condições vulneráveis se agravam, com impactos sociais e ambientais. A certificação concedida à Ufba vem ao encontro dessa realidade ao permitir, no nível acadêmico, a implementação de assistência técnica junto às comunidades demandantes, envolvendo diversos agentes sociais e instituições. Na justificação dada pela organização do Prêmio Fundação Banco do Brasil, destaca-se a importância do papel extensionista das universidades públicas nesse propósito, “ao tornar-se fundamental pelas possibilidades irrigadoras de soluções partilhadas, mediação e realização de tecnologias sociais próprias e inovadoras, condição essencial para a produção e melhorias de habitação adequada para cidades sustentáveis”.

Os projetos de serviços para a melhoria de habitações em comunidades de baixa renda de Salvador e cidades do interior do estado são realizados exclusivamente com recursos da universidade pública, o que reforça a importância da manutenção de políticas públicas e de financiamento para o ensino. Ao longo da Residência em Arquitetura, Urbanismo e Engenharia – Especialização em Assistência Técnica, Habitação e Direito à Cidade – com duração média de 15 meses – as equipes de estudantes e professores elaboram, gratuitamente, projetos de serviços para melhoria de habitações em comunidades de baixa renda em Salvador e cidades do interior do estado. “Nosso objetivo é fazer com que os profissionais da Arquitetura saiam dos seus muros para contribuir com a sociedade, para o seu desenvolvimento e avanços”, afirma Angela Gordilho, coordenadora e idealizadora da Especialização em Assistência Técnica, Habitação e Direito à Cidade da FAUfba.

Praças, parques, melhorias de acesso, planos de arborização, dentre outras propostas, são idealizadas individualmente pelos alunos durante o programa, que tem duração de 14 meses. De acordo com a coordenadora, os projetos são elaborados a partir da demanda das comunidades. Os alunos visitam, conversam e identificam as demandas dos moradores, para depois construir planos de melhorias. Até agora, a elaboração de 73 projetos participativos teve atuação em 25 comunidades e territórios, com um alcance total de 4,5 mil pessoas envolvidas no conjunto de atividades. De acordo com Angela, todos os projetos entregues às comunidades podem incentivar a captação de recursos para as obras em execução, estimulando a aproximação do poder público com comunidades carentes.

Segundo a coordenadora, a conquista da certificação representa um grande marco e vai possibilitar que, a partir de 2020, o programa de residência ganhe status permanente em nível de pós-graduação na FAUfba. Para que o caráter permanente se torne realidade, faltam apenas alguns ajustes na metodologia aplicada ao longo dos últimos três cursos. A nucleação com outras 4 universidades também incentivou a implantação, em 2020, do programa de residência na Universidade Federal de Pelotas (RS), Universidade Federal da Paraíba, Universidade de Brasília e Universidade Federal do Ceará.

Projeto de José Meira e Silva Neto – Parque Theodoro Sampaio